Igual a um fatality, filme não perdoa e acaba de vez
Talvez esse subtítulo aí seja ambíguo — mas foi essa a intenção. Então, o que escrever sobre uma das franquias de jogos mais populares dos últimos 30 anos, que foi adaptada pela terceira vez para o cinema? Bem, primeiramente, por ser fã e ter crescido jogando os jogos, obviamente, tenho uma relação bem próxima com esse mundo de pessoas matando pessoas na porrada, explodindo-as — o que por si só poderia me colocar em uma situação complicada. Mas isso não vai acontecer.
Desde já, posso afirmar: o clássico maravilhoso de 1995 é muito, mas muito melhor do que essa “joia” aqui. Apesar de a violência inexistir na primeira adaptação, o que é estranho se for parar para pensar, o filme é mais redondo. Sei que isso depende da intenção do diretor — ou estúdio —, mas tem que se destacar quando isso traz mais substância à obra. Esse de 2021, mesmo tendo quase duas horas, é tão rápido e raso, que chega a soar comicamente. É possível identificar a intenção por trás de certas cenas, mas elas se dissipam ao vento, devido ao tamanho desprezo em trabalhá-las.
Um pilar que o diretor Simon McQuoid, que fez a estreia na direção de longas-metragens, apoiou-se foi, nitidamente, na mitologia do próprio universo do jogo, e não na história a qual ela pertence. Os personagens vão sendo jogados um atrás do outro sem que haja um cuidado no porquê de estarem ali — apesar de haver um motivo insosso. É como se o fato de eles serem quem são já bastasse para a introdução deles. Contudo, isso não leva em consideração que muitos não conhecem a história e que estão pouco se fodendo para Liu Kang, Scorpion, Jax ou qualquer outro personagem.
Narrativamente o filme é funcional, mas é como se ele boiasse na superfície de uma piscina de quintal, com medo de se afogar em 10 centímetros d’água. Não há profundidade alguma e quando isso — quase nunca — é tentado soa pífio. E há certos atores, logo, personagens, que ficaram caricatos — o que é o Reiko?!
As cenas de lutas deixam muito a desejar, pois, ao contrário do seu irmão mais velho, que usou artistas marciais, além de alguns atores que realmente lutavam, aqui as lutas são monótonas, enfadonhas. E a violência também não foi explorada com entendimento. Os momentos em que elas ocorrem não são dramáticos nem tensos. Com exceção do Jax, que tem os braços explodidos pelo Sub-Zero — mas que já havia sido mostrado no trailer —, o resto é qualquer coisa de qualquer jeito. Novamente, não acho obrigatório um motivo explicável para justificar tudo, mas Mortal Kombat é um filme grande, de uma franquia grande, então há a necessidade de ter mais tato com o que se tem em mãos.
Também é compreensível que sejam feitas alterações na trama para que ela se encaixe na proposta pretendida, porém para cada escolha há uma perda. Ao decidirem acrescentar um personagem novo, isso retirou o protagonismo dos já conhecidos. A Sonya, por exemplo, poderia ser facilmente a linha que conduziria a história; ou o Liu Kang, só para citar dois. Mas ao introduzirem o Cole, essa força que os personagens têm foi perdida, pois ela não foi aproveitada.
Outro ponto foi no enredo. Há muitas decisões que não funcionaram e que só tornou tudo ainda mais bizarro. Uma delas é a velha fórmula do “escolhido”, em que uma vida que nasceu predestinada para ser o responsável que porá fim nas sombras. Não por ela em si, mas pela forma que é utilizada. Neste caso, ela serviu como uma ponte para um personagem em questão aparecer.
A trilha sonora também foi uma grande decepção. Sem presença, pôs-se genericamente. E, além disso, a famosa Techno Syndrome, do famigerado filme de 1995, foi ignorada, aparecendo somente nos créditos finais — e com um arranjo horroroso. Ficou péssimo!
As atuações também são muito aquém de um mínimo razoável. Com exceção do Kano, que trouxe um alívio cômico bem-vindo, e da Sonya, os demais pareceram se esforçar para tentar parecer com quem eles deveriam lembrar. Elas não são ruins, apenas desprovidas de qualidade — acho que isso significa que são ruins, então... Enfim.
Há vários personagens bacanas que poderiam ter sido explorados, dando uma base sólida e um contexto gratificante. Mas, não, resolveram seguir por um caminho batido sem a menor intenção de desenvolvê-los.
E tenho que dar os parabéns ao ser que pensou que seria foda excluir a presença do torneio, o Mortal Kombat, do filme. É tão grotesco essa escolha, pois invalida o que é a própria história: seres humanos lutando em um torneio para impedir que a Terra seja invadida por outro reino. A impressão que tive é que essa decisão foi tomada para facilitar a narrativa — e nem vou me dar ao trabalho de falar da preguiçosa utilização de texto, no início do filme, para introduzir o público a respeito das regras do Mortal Kombat e o que está prestes a acontecer.
Bem, o que poderia ter sido um leve acalento aos olhos do público, seria o visual dos personagens. Mas ficou no meio termo também. A Nitara, por exemplo, está imbuída de um CG asqueroso; e outros têm aquela porcaria de aparência de cosplay amador — eu achei o Shang Tsung espalhafatoso demais. Mas teve os que ficaram bacanas.
Finalizando, Mortal Kombat é um filme ruim, bem longe é uma produção satisfatória. Para quem esperava um oceano de sangue, vísceras e ossos voando, não terá isso. Para os que queriam uma estética mais sombria e nociva, também não terá isso. Talvez os que curtem algo mais genérico, pré-formulado em uma sala de um estúdio burocrático, sintam-se agraciados.
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